Vozes murmurando, suplicando, rindo, chorando, gritando.
Vozes. Ela as ouvia por toda a casa, em todos os cômodos. Todos os dias, há todas as horas.
Vozes que incomodavam, assustavam e, por vezes, lhe perturbavam a vida, mas que depois de certo tempo já faziam parte do seu cotidiano. Ela já não se incomodava, apenas as ouvia.
Algumas vezes tentava responder, conversar, mas não tinha sucesso. As vozes eram solitárias, não se davam conta de que tinham uma ouvinte, igualmente solitária.
A família lhe dizia que eram coisas da sua imaginação, que a mente estava lhe aplicando peças. Os médicos diziam que eram alucinações, provavelmente, causadas pelos fortes remédios que tomava. Bobagem. Ela tinha certeza que elas estavam lá.
Vez por outra, as vozes sumiam por um tempo. Ela achava que tinham ido embora. Mas logo, ouvia umas risadas na sala, alguns choros no quarto, gritos durante a noite. Súplicas, orações, pedidos, declarações. Ela ouvia de tudo.
E assim os anos foram passando. Suas mãos foram ficando trêmulas e enrugadas. Os cabelos embranqueceram, o andar foi perdendo a agilidade. Só o ouvido continuava funcionando bem. As vozes se mantinham fiéis, mais fiéis do que a família, que a bons anos colocaram-na nesse asilo. No inicio eles ainda vinham todos os sábados. Traziam doces, frutas e passeavam com ela pelo jardim. Depois vinham somente nos natais e aniversários. Traziam alguns presentes e rapidamente iam embora. Hoje raramente aparecem para vê-la.
Diziam que ela tinha problemas, que precisava se tratar. Não entendiam que ela apenas ouvia vozes. Vozes que até hoje ela escuta, tanto nos corredores pálidos quanto nos jardins mórbidos daquele lugar. Vozes que hoje são sua única companhia.
Um comentário:
Muito bom! Essa, infelizmente é a realidade da maioria dos idosos, quando não estão abandonados pelas ruas.
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